Ao longo do meu caminho, vivi dois partos naturais dos filhos que perdi, a Júlia e o Pedro. Mas essa foi a primeira vez que vivi um parto para “verdadeiramente” parir.
Tive uma gravidez com muitos desafios, muito acompanhamento, muito cuidado e me deparei o tempo todo com o “risco” de perder. O meu histórico me mostrava que era necessário fazer repouso, mesmo com a cerclagem, os pontos no útero, eu não poderia correr riscos. A minha médica falava: “O melhor é ficar deitada, nem sentada quero que você fique, agora o que vale é a lei da física, na horizontal é o ideal”. Inclusive comprei um sofá cama para a minha sala, para seguir as ordens médicas com mais conforto.
E assim fomos seguindo grávidos, com muita cautela, todo cuidado era pouco. Apenas às quartas feiras que costumávamos abrir uma exceção e fugir para a praia, onde eu fazia meu repouso de uma forma mais aprazível.
Quando estava por volta das 32 semanas de gravidez eu comecei a me sentir sem energia e sem ânimo para nada, cansada física e emocionalmente. Busquei ajuda na antroposofia, na psiquiatria e na terapia artística, através da qual me ocupei com os trabalhos manuais, fazendo crochê, pintando, fazendo argila, sempre em busca de um sentir mais profundo. Mesmo assim, nada era suficiente para me resgatar desse lugar sem luz, desvanecido.
Iris, minha doula, dizia que eu estava enfrentando uma depressão pós-parto um pouco diferente, no pré-parto, porque eu, ao contrário de muitas mães, estava vivendo a privação da liberdade e as grandes mudanças antes dela nascer, tive que abrir mão de muita coisa. Iris dizia que quando ela nascesse meu sentimento seria bem diferente do que a maioria das mulheres normalmente sentem quando dão à luz. Ela falava que eu sentiria o gostinho de liberdade! Fazia sentido, mas mesmo assim eu tinha medo da possibilidade de estar desanimada assim quando a Maria estivesse em meus braços. Bernardo, meu marido, dizia que quando eu visse Maria eu me apaixonaria e toda esta tristeza iria embora. Esse era o meu desejo, mas estava mesmo, muito apreensiva.
Ficava pensando em leituras e conversas e teve uma frase que ficou marcada: “este amor incondicional de mãe não existe, você pode não amar sua filha no ínicio, essa coisa de instinto materno não existe…”
Enfim, no dia de Finados, na madrugada do dia 2, começaram as dores e as contrações apertaram, e às 4h30 da manhã, meu marido me levou para a maternidade.
Meu maior desejo, além de ter uma filha com saúde, era conseguir parir sem intervenções, naturalmente e, portanto, sem anestesia. Meu sonho sempre foi ter um parto domiciliar, mas aceitei que não seria possível devido às circunstâncias.
Minha doula foi muito importante em todo esse processo e principalmente no trabalho de parto, quando sua confiança e sua calma me deram força e coragem. Eu sentia uma dor surreal e ela me ajudava me mostrando novas respirações e posições, ou qualquer outra coisa que me acalmasse e me ajudasse a enfrentar as dores.
E foi assim, das 5h às 8h54 da manhã, quando Maria nasceu. As últimas 2h foram exaustivas, achei que fosse desmaiar. Já quase sem sentido, percebi que ela estava nascendo, saímos do quarto e fui encaminhada para sala cirúrgica. Lá uma enfermeira que surgiu nesse momento dizia, “vai Paula, faz força, sua filha está nascendo! Força Paula!”. E assim nossa pequena veio ao mundo, nunca vivi nada tão mágico! Receber em meus braços aquele serzinho que saiu de dentro de mim, foi uma emoção sem tamanho. Olhar para aquela “perfeição”, cada dedinho, cada fio de cabelo, senti a maior plenitude da minha vida!
Hoje eu posso falar com toda a certeza do mundo que sim, pra mim existiu o amor incondicional desde o primeiro momento em que olhei para minha filha! Minha depressão se desmanchou em segundos. O parto foi a cura, me empoderou, tive orgulho de mim, de conseguir acreditar e confiar no meu corpo.
Bena esteve sempre ao meu lado, sempre parceiro, me observando, me apoiando e acreditando na minha força e capacidade de parir.
Acredito que não existe receita, nem regra, nem o que deve acontecer com cada um de nós durante o parto. É algo individual e intransferível, assim como as nossas digitais. O mais importante é confiar que sentimos o que precisamos sentir. Muitas mães não sentem esse amor imenso que senti no primeiro olhar para a Maria, e tudo bem, cada processo é um, cada um tem a sua vivência. Somos seres distintos e todo sentimento é válido. Vale amar à primeira vista e também vale não amar. O essencial é estar presente e sentir o que for para sentir.
Há quatro anos que estou “me tornando” mãe, acho que é um movimento eterno o TORNAR-SE MÃE. Um mundo de descobertas, um belíssimo desafio e um maravilhoso processo de autoconhecimento, troca e crescimento.
Estava plena, muito feliz, completamente apaixonada, Maria prá mim sempre foi um anjinho e como Iris dizia, me sentia mesmo livre, leve e solta, com um “babypocket”, (brinco que até 6 meses, os bebês são seres facilmente transportáveis, coloca no “bolso” e vai), saía para passear como nunca havia feito durante a gestação. Maria me deu asas!
E a aventura estava só começando.
Hoje continuo agradecendo do fundo do meu coração por todo carinho, apoio, incentivo e amor que recebi no decorrer de todo este processo. Não tenho palavras para as nossas famílias que estiveram sempre presentes, mesmo longe fisicamente e ao meu maior parceiro, meu marido e pai da Maria. Em momentos desafiantes como esse, pequenos gestos alheios, significam muito e nos confortam.
Agradeço, agradeço e só agradeço.
Com amor,
Paula Cury
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